29 de junho de 2008

A guerra civilizada



Em Abril de 2007, Portugal, através do IPAD (Instituto Português de Cooperação para o Desenvolvimento), ofereceu um estádio de futebol à Palestina. Na altura, o acontecimento foi profusamente comentado na blogosfera lusa, quase sempre com fortes críticas centradas nos custos do projecto, revelando uma característica de mesquinhês que atormenta muitos dos portugueses e, por conseguinte, a lusosfera. Apesar disso, e muito para além disso, uma reportagem de rua realizada por um canal português de televisão na cidade de Al-Kahder, revelava o grande interesse que a construção do estádio despertou na Cisjordânia e também um aspecto muito interessante: os entrevistados, pessoas comuns que, como qualquer um de nós, trabalham para levar para casa o sustento da família mas que diferentemente de nós, enfrentam todos os dias a fatalidade de viverem numa região entregue a uma guerra sem fim, manifestavam o desejo de um dia poderem, tal como os europeus, resolver conflitos e diferendos entre bairros, cidades e países, através do futebol. Sem dramas, sem armas, sem dor.
Para quem não vive em guerra, o futebol pode ser um espectáculo interessante em si mesmo, mas que envolve inúmeros aspectos menos dignificantes, sendo um deles, a agressividade que acompanha muitos dos eventos futebolísticos. Eduardo Jorge Madureira, em postagem publicada no Avenida Central, em 10 de Junho, defende que a recente publicidade do SCB, "os guerreiros do Minho", constitui uma tentativa de naturalização da violência. No entanto, o psicanalista Winnicott considera a agressividade um comportamento normal e necessário ao ser humano. Também de acordo com Ramonet, citado por Eduardo J. Madureira, o futebol é uma alegoria da guerra. Se nos recordarmos que algumas das piores barbaridades da História foram cometidas, não há muito tempo, por países pertencentes ao grupo dos que gostamos de considerar "civilizados", não nos repugna nada afirmar que a escolha se reduz simplesmente à guerra ou à sua alegoria, assim como, recorrendo a um mero exercício de lógica, não nos é difícil supor que o futebol, considerado como um fenómeno social canalizador da violência, talvez já nos tenha livrado de algumas situações incomensuravelmente mais desagradáveis.
Hoje realiza-se o último jogo do campeonato europeu de futebol, o jogo que vai decidir o campeão. Que ganhe o melhor! (Ou deveria dizer, "Ave Caeser, morituri te salutam"?)

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